Domingo, 3 de maio, foi o Dia Mundial da Liberdade de Imprensa. Que no Brasil foi devidamente “comemorado”, ao nível e ao gosto de Jair Bolsonaro, com agressões a jornalistas do Estado de S. Paulo que em Brasília faziam a cobertura de uma manifestação de apoio ao inqualificável e inimaginável Presidente. Mais uma daquelas em que participa vindo agradecer e dizer uns dislates aos “apoiadores”. Manifestações que incluem reclamar o encerramento da Câmara dos Deputados, (apesar de nela existir uma maioria de direita que à partida o apoiava), e o do próprio Supremo Tribunal Federal (STF). Sendo este o orgão máximo do poder judiciário, equivalente ao nosso Supremo, mas com as competências também de Tribunal Constitucional – só que com muitíssimos mais poderes que o nosso, em particular de intervenção, e imediata, em relação a decisões do Governo. E por isso a “sanha” de Bolsonaro contra o STF, que tem impedido alguns atos violadores da Constituição e mandado investigar outros, criminosos, a que se suspeita estarem ligados filhos do Presidente.
Simplificando e sintetizando: o desejo de tais “apoiadores”, que Bolsonaro estimula, é um regresso, sem máscara, à ditadura. Além disso, da parte do ex-deputado que ao votar o “impeachment” de Dilma Roussef deu um viva ao seu cruel torturador, tem havido uma série de condutas, incluindo em relação ao combate à Covid19, que para lá de poderem configurar crimes, me levam a usar a seu respeito aqueles adjetivos: inqualificável, inimaginável.
O adiamento da entrega do Prémio Camões Adiante. Porque trago isto agora à colação por dois motivos. Primeiro, notar que se um escritor da qualidade de Ignácio Loyola Brandão, no seu texto para o nosso Tema, se centra muito em Bolsonaro e diz o que diz a seu respeito, tal se explica pelo que ele é e representa, constituindo uma enorme preocupação e um constante susto para os brasileiros democratas, em particular para escritores, artistas, jornalistas, intelectuais, que veem a sua liberdade e o seu trabalho ameaçados. E noto que no texto de Onésimo Teotónio Almeida também está muito presente Donald Trump… Um modelo para Bolsonaro – com o discípulo brasileiro, porém, a conseguir a proeza de ainda ser pior, ou mais visivelmente “primário”, do que o seu mestre norte-americano.
O segundo motivo é lamentar muito que a funesta pandemia também tenha tido como inevitável consequência adiar a entrega do Prémio Camões ao Chico Buarque, prevista para 24 ou 25 de Abril. Lamentar porque estou certo ia ter uma grande repercussão – e há muito aqui me bato por essa entrega ser valorizada e ocorrer, para atingir tal objetivo, em novos moldes, não da forma do costume, burocrática e cada vez menos simbolicamente representativa. E lamentar ainda mais porque estou certo que tal entrega constituiria também, de par com algumas iniciativas paralelas, um expressivo testemunho da solidariedade e apoio dos portugueses àqueles seus companheiros, parafraseando Torga, do cais do lado de lá do nosso destino.
Em defesa da Amazónia e sua população Última nota: se há imensas malfeitorias de Bolsonaro diariamente flagrantes, há outras mais ausentes dos noticiários mas de possíveis consequências dramáticas, devastadoras. Uma delas é o que tem e não tem sido feito na Amazónia, em termos de proteção da natureza e dos povos indígenas. E um grande artista/cidadão, o fotógrafo Sebastião Salgado, com sua mulher Lélia, lançou, também neste domingo, 3, um manifesto denunciando ao mundo que esses povos “estão em perigo” e “a pandemia, que se propaga rapidamente pelo Brasil, poderá exterminar os índios que ali vivem e não têm nenhuma defesa” – perigo agravado pelas recentes “invasões das reservas por garimpeiros e madeireiros”. O risco de “genocídio é real”, e o desaparecimento da população indígena seria uma “tragédia colossal para o Brasil e uma perda para a humanidade”, escreve-se no manifesto, subscrito logo à partida por perosonalidades famosas de todo o mundo, de Pedro Almodovar a Paul McCartney, de Mario Vargas Llosa a Madonna, do princípe Alberto a Oprah Winfrei ou Gisele Bundchen, etc., etc.
